Terreiros em movimento: Ativismo e mobilização na luta por justeza e modos de vida
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Por Ana Paula Miranda

✅28/10/2025 | 20:41
O Encontro Ginga e a força política dos terreiros
O Grupo Ginga-UFF realizou o seu IV Encontro, com o tema “Terreiros em movimento: Ativismo e as formas de mobilização dos povos de terreiro no Judiciário e na Educação”. O evento reuniu pesquisadores, lideranças religiosas e representantes de movimentos sociais para refletir sobre as diferentes formas de resistência, organização e produção de saberes protagonizadas pelos povos tradicionais de matriz africana.
Em um contexto nacional ainda marcado pelo racismo religioso e pelas desigualdades sociais, os terreiros se afirmam como espaços de diálogo e construção política, estabelecendo pontes entre o Estado, a sociedade e o sagrado.
Ativismo, mobilização e articulação coletiva de terreiros
Mais do que espaços religiosos, os terreiros são territórios de resistência. Neles, fé, ancestralidade e política se entrelaçam na luta pelo reconhecimento de direitos e pela preservação da vida comunitária. O encontro buscou discutir como se constroem as mobilizações e os ativismos das comunidades de terreiro.
As mobilizações dos povos de terreiro têm se fortalecido através de redes, fóruns e frentes inter-religiosas, como, por exemplo, a Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro), os Fóruns de Religiões de Matriz Africana e as Comissões de Liberdade Religiosa nos diferentes estados.
Esses espaços têm promovido diálogo com o Judiciário, políticas públicas de educação, saúde e meio ambiente, e formado lideranças que atuam tanto em conselhos participativos quanto em universidades e órgãos de governo.
A presença dos terreiros nessas arenas políticas evidencia que o ativismo afrorreligioso não é apenas uma reação às violências sofridas, mas também uma proposição de novas formas de convivência, justiça e cidadania, guiadas pelos valores do axé, do cuidado e da coletividade, que desafia a estrutura colonial que ainda marca as instituições públicas brasileiras.
Justeza: justiça com axé e ancestralidade
A reflexão proposta por Adailton Moreira e Thula Pires, no artigo “Nossa luta é por justeza”, oferece uma reflexão relevante sobre a concepção de justiça, que não deve ser considerada apenas pela letra da lei, mas analisando aspectos como equidade, axé e ancestralidade.
Essa ideia amplia o horizonte da justiça estatal e secular, incorporando dimensões éticas, espirituais e coletivas que foram silenciadas pela modernidade colonial, que reafirmam a força da ancestralidade e a importância da pluralidade para a democracia.
Racismo ambiental e resistência cotidiana
O ativismo dos terreiros também se manifesta na defesa da natureza e do território sagrado. Ainda assim, essas comunidades enfrentam o chamado racismo ambiental, uma forma de discriminação que combina preconceito religioso, desigualdade territorial e exclusão simbólica.
Muitos terreiros estão em áreas periféricas, sem regularização fundiária, e sofrem remoções, incêndios e destruição de espaços sagrados, resultando em perdas materiais e espirituais.
Além disso, práticas tradicionais como o uso de ervas, oferendas e o toque dos atabaques vêm sendo criminalizadas como poluição sonora ou crime ambiental, revelando tentativas de silenciar símbolos centrais das tradições afro-brasileiras.
As restrições ao uso de praias, rios e matas para rituais reforçam essa exclusão, negando às comunidades o direito de se relacionar com a natureza segundo suas cosmologias.
Educação, arte e ativismo como caminhos de transformação
Diante das violências e das tentativas de apagamento, os povos de terreiro reafirmam sua presença política e espiritual.
Através da educação, da arte e do ativismo, constroem novas formas de diálogo com a sociedade, defendendo que proteger o axé é proteger a vida, a diversidade e o meio ambiente.
Ao transformar as instituições e propor novos sentidos de justiça e reparação, os povos de terreiro mostram que a luta política é também uma luta pela justeza — por um mundo onde todas as formas de vida possam existir em plenitude.
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Ana Paula Mendes de Miranda
Doutora em Antropologia (USP); Professora da Universidade Federal Fluminense; Coordenadora do Ginga; Pesquisadora do INCT Ineac.
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