O que é interseccionalidade?
- WR Express
- 19 de jun.
- 3 min de leitura
Por: Gisele Rose

✅ 19/06/2025 | 11:51
Nos primeiros anos do século XXI, o termo “interseccionalidade” passou a ser amplamente adotado por acadêmicas e acadêmicos, militantes de políticas públicas, profissionais e ativistas em diversos locais. Estudantes de ensino superior e docentes de áreas interdisciplinares, como estudos feministas, estudos raciais, estudos culturais, estudos da civilização estadunidense e da mídia, bem como da sociologia, da ciência política, da história e de outras disciplinas tradicionais, encontram a interseccionalidade em cursos, livros e artigos teóricos (COLLINS e BILGE, 2020, p. 01).
Para a professora de Direito na UCLA e Columbia Kimberlé Williams Crenshaw, a teoria da interseccionalidade surgiu, especificamente, para resolver um problema particular. “É importante esclarecer que o termo foi usado para verificar a aplicabilidade do feminismo negro em leis antidiscriminação”, diz ela. Na palestra realizada na LSE naquela noite, ela trouxe o caso de Degraffenreid vs General Motors, em que cinco mulheres negras processaram a GM por discriminação de raça e gênero. “O principal desafio da lei é a forma como foi fundamentada, porque a lei antidiscriminação olha para raça e gênero como elementos separados”, diz ela. “A consequência disso, é que as mulheres negras americanas — ou quaisquer outras mulheres não-brancas — vivem a experiência de uma discriminação por sobreposição ou conjunta. A lei, inicialmente, não estava lá para vir em sua defesa” (Fonte: Portal Geledés).
A interpretação dos tribunais foi de que as mulheres negras não podiam provar a discriminação de gênero, porque nem todas as mulheres foram discriminadas, e também não puderam provar a discriminação racial, porque nem todas as pessoas negras eram discriminadas. Uma associação de discriminações seria, aos olhos dos tribunais, constituir um tratamento preferencial, algo que ninguém poderia fazer. Crenshaw ri quando acrescenta: “É claro, ninguém mais tinha que fazer isso. Interseccionalidade foi uma forma de chamar a atenção para o que os tribunais não estavam vendo” (Fonte: Portal Geledés).
Quanto a acusação de que interseccionalidade não é um conceito novo, ela filosofa: “Bem, um monte de coisas não são novas”, diz ela. “Classe não é um conceito novo e raça também não é novo. Porém, continuamos a debater e falar sobre esses assuntos, então, o que há de tão incomum no fato da interseccionalidade não ser um conceito novo? Por esse motivo não deveria haver razões para falar sobre isso? A interseccionalidade chama a atenção para invisibilidades que existem no feminismo, na luta contra o racismo, nas políticas de classe, então, obviamente é preciso muito trabalho, já que somos constantemente desafiados para estar atentos aos aspectos do poder que não fazem parte de nossas experiências pessoais”. Mas, ela enfatiza, esse tem sido o projeto do feminismo negro desde seu início: chamar a atenção para as lacunas, para as maneiras que “as mulheres de cor são invisíveis na visão geral” (Fonte: Portal Geledés).
Nas décadas de 1960 e 1970, as ativistas negras estadunidenses enfrentaram o quebra-cabeça que fazia suas necessidades relativas a trabalho, educação, emprego e acesso à saúde simplesmente fracassarem nos movimentos sociais antirracistas, no feminismo e nos sindicatos que defendiam os direitos da classe trabalhadora. Cada um desses movimentos sociais privilegiou uma categoria de análise e ação em detrimento de outras: por exemplo, raça no movimento em favor dos direitos civis; gênero no movimento feminista; classe no movimento sindical. Considerando que as afro-americanas eram também negras, mulheres e trabalhadoras, o uso de lentes monofocais para abordar a desigualdade social deixou pouco espaço para os complexos problemas sociais que elas enfrentam (COLLINS e BILGE, 2020, p. 18-19).
“O que faz com que uma análise seja interseccional não é o uso que ela dá ao termo ‘interseccionalidade’ nem o fato de estar situada numa genealogia familiar, nem de se valer de citações padrão”, nosso foco deve ser “o que a interseccionalidade faz e não o que a interseccionalidade é.” (COLLINS e BILGE, 2020, p. 16).
Referências
COLLINS , Patricia Hills e BILGE, Sirma. Interseccionalidade. 1. ed. - São Paulo: Boitempo, 2020.
Gelédes: <https://www.geledes.org.br/kimberle-crenshaw-sobre-intersecionalidade-eu-queria-criar-uma-metafora-cotidiana-que-qualquer-pessoa-pudesse-usar/> Acesso em: 04 de junho de 2025.

Gisele Rose
Filósofa e escritora. Professora da Secretaria Estadual de Educação do Rio de Janeiro (SEEDUC-RJ). Mestra em Relações étnico raciais pelo Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ), Especialista em Energia e Sociedade no Capitalismo Contemporâneo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Graduada em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)... [+ informações de Gisele Rose]
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