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Diáspora Cigana

  • Foto do escritor: WR Express
    WR Express
  • 24 de mai.
  • 3 min de leitura

Por: Pai Caio

Foto: Reprodução

24/05/2025 | 22:04


A história do povo cigano — também conhecidos como Roma, Sinti, Kalon, entre outros grupos — é marcada por uma longa jornada de deslocamento, resistência e reconstrução cultural. Sua origem remonta ao norte da Índia, por volta do século XI, quando se iniciou uma grande diáspora rumo ao Oriente Médio, Egito e, posteriormente, à Europa. Esse êxodo foi impulsionado por invasões, conflitos políticos e opressão, que se repetiriam em diversos contextos ao longo dos séculos.



Documentos indicam que, após uma invasão no Norte/Noroeste da Índia, uma grande casta de guerreiros iniciou uma diáspora rumo ao oeste do antigo Vale do Indo. Ao adentrar o continente europeu, os ciganos enfrentaram preconceito, marginalização e políticas de assimilação forçada. Durante a Idade Média — também chamada de "Idade das Trevas" — eles foram perseguidos, banido das cidades e rotulados como hereges, bruxos e criminosos. Em muitos reinos europeus, foram alvo de leis discriminatórias que impediam sua circulação, moradia e exercício de ofícios tradicionais, como música, artesanato e a leitura da sorte.


Antes mesmo da institucionalização do tráfico transatlântico de africanos escravizados, documentos históricos indicam que ciganos já estavam entre os primeiros grupos forçados ao trabalho degradado nas colônias portuguesas, inclusive no Brasil. Condenados em Portugal por delitos muitas vezes ligados apenas à sua origem étnica, eram deportados como degredados — uma mão de obra compulsória inserida no processo de colonização.


No século XX, a Segunda Guerra Mundial expôs novamente a violência histórica sofrida pelos ciganos. O regime nazista classificou os povos ciganos como “raças inferiores” e 1,5 milhão dos mesmos foram assassinados nos campos de concentração, embora algumas estimativas apontem para números ainda maiores. Esse genocídio, conhecido como Porajmos (devoração, em romani), é uma das páginas mais sombrias da história cigana.


No Brasil, a presença de falanges espirituais ciganas, se dá a partir da década de 1950, quando a umbanda passou a incorporar entidades ciganas em suas giras. Essa integração ocorreu em paralelo ao pós-guerra, num momento em que a memória do genocídio nazista ainda era recente e a necessidade de cura espiritual, premente. Na década de 70, houve um crescimento exponencial dos acampamentos ciganos no Brasil, com destaque para o Nordeste, especialmente a Bahia.


Na Umbanda, a falange dos ciganos se apresenta como uma linha de trabalho espiritual voltada à liberdade, à intuição, ao encantamento e à sabedoria ancestral. Diferentemente de outras entidades que carregam arquétipos de sofrimento, os ciganos da umbanda geralmente se manifestam com alegria, danças, perfumes e cores vibrantes — símbolos de sua resiliência e da celebração da vida.


No primeiro momento, apresentavam-se nas giras que eram convidados como de Exús e Pombagiras; hoje possuem giras próprias em muitas casas, influenciando a estética, as magias, os oráculos e cosmogonia. Muitos deles, expulsos de seus territórios de origem, como bons andarilhos e alta capacidade de adaptação, os ciganos armaram suas Tsaras em terreiros, também nos ensinando sobre amor, cura e prosperidade.


Essa presença no imaginário religioso afro-brasileiro reforça a trajetória dos ciganos como guardiões de um saber antigo, espiritual e marginalizado. Longe de um grupo folclórico, sua participação na umbanda é um testemunho da interculturalidade brasileira — fruto de uma história de encontros, choques e acolhimentos que atravessa séculos de colonização, escravidão e perseguições.


Umbanda é a religião dos marginalizados por defenderem suas tradições e praticarem tecnologias ancestrais como é o caso dos caboclos, pretos velhos, pombagiras, malandros e os ciganos. Religião enquanto registro perante a necessidade de politicas públicas voltadas para os povos tradicionais, e como ente de luta e organização socio-espiritual em defesa da abolição plena de todos os povos historicamente oprimidos e subjugados.


Hoje, reconhecer a história dos ciganos no Brasil é também reconhecer uma dívida cultural e social. Seja nas estatísticas que ainda os apontam como vulneráveis à exclusão, seja nos terreiros que lhes abrem espaço como entidades espirituais, os ciganos continuam sua jornada: nem exilados, nem fantasmas — mas vivos, dançantes, presentes e resistentes.


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Pai Caio

Caio Bayma nasceu na Baixada Fluminense, Nilópolis, foi morar no Morro dos Macacos por conta da proximidade com o trabalho, faculdade e atuação no movimento social, hoje reside no centro do Rio de Janeiro. Graduando em Matemática, integra a equipe do Observatório Adolescente (OPPA /UERJ) no eixo de religiosidade e atuou como primeiro extensionista na Superintendência de Saberes Tradicionais da UFRJ.   [+ informações de Pai Caio]


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Artigo de Opinião: texto em que o(a) autor(a) apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretações de fatos, dados e vivências. ** Esse texto não reflete, necessariamente, a opinião do AxéNews.


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