Por: Babalawo Rogério Amorim
16/03/2024 | 12:06
Ifá talvez seja a mais emblemática das tradições de matrizes africanas que chegou ao Ocidente. Proveniente da África Ocidental, fixou-se e enraizou-se em Cuba, expandindo-se pelas Américas do Norte, Central e do Sul, bem como pelo restante do mundo. Nesse sentido, torna-se salutar um espaço em que possamos a um só tempo explanar e explicitar alguns aspectos extremamente importantes para o conjunto da comunidade, afinal, a Sabedoria de Ifá é o próprio Pensamento e Desejo de Olodumare (Deus).
Trata-se, como podemos perceber, não apenas de um sistema oracular e de práticas religiosas bastante solidificado e com regras bem definidas, mas também dotado de conceitos filosóficos em que estão contidos os desígnios de Olodumare para a humanidade, com as leis, regras, valores, limites que necessitamos de ter ao longo da vida os quais à medida que nos alinhamos, à medida que adquirimos a noção e o parâmetro de certo e errado, adequado ou não adequado, tendemos a encontrar paz, saúde, bem-estar, felicidade, a partir do nosso próprio propósito neste mundo.
É dentro de Ifá, portanto, que estão contidos os segredos da vida e da morte e de todas as coisas que existiram, existem e existirão no mundo. É em Ifá que Olodumare registrou toda a sua criação. Consequentemente, é com o auxílio dessa Sabedoria que podemos nos nutrir do saber necessário para lidarmos não apenas com o sucesso e as vitórias — em que muitas vezes também há seu elemento complexo —, mas, sobretudo, também a cuidar dos desafios existentes no mundo para superar tais infortúnios e assim nos encarregar adequadamente com o Destino que a nós foi recomendado por Deus.
A esta altura cabe atentarmos que Ifá é um sistema criado por Deus, sendo, como falamos anteriormente, o seu Próprio Pensamento, Raciocínio e Desejo. Nesse sistema encontra-se os rituais, a teologia, a filosofia cuja base foi construída a partir da essência do povo iorubá.
O sistema de Ifá narra parte do segredo da vida baseado na passagem dos deuses iorubás — Orixás — sobre a Terra. Consequentemente, os Orixás existem graças ao sistema teológico de Ifá. Dessa maneira, um ponto fundamental precisa de ser sempre frisado: não existe Orixá sem Ifá e nem Ifá sem Orixá. Ifá é o princípio de todas as coisas, a própria criação divina e é no próprio sistema teológico de Ifá que podemos encontrar os Odus em que os Orixás nascem. Os Orixás, em diversas passagens nos escritos de Ifá, recorreram à Sabedoria de Orunmila com a intenção de encontrarem-se no mundo.
Os Orixás foram criados por Olodumare para ajudar o homem em sua trajetória na Terra. Eles representam a essência do Homem, as características positivas e negativas de cada um. Essa abordagem divina não apenas objetiva manter a imagem de Deus intocada, mas também a de sermos guiados por deuses que fossem a um só tempo sagrados e fossem quase como nós, espelho e imagem do Homem. É daí que surgem os arquétipos, como Ogun trabalhador, guerreiro, , do desenvolvimento e da tecnologia, cujo raciocínio está mais para a brutalidade do que para aspectos mais finos; ou Oxum, a deusa do amor, da vaidade feminina, da mulher intuitiva e de grande sabedoria, para ficarmos só com dois.
Esse conjunto cultural, teológico e filosófico é o que chamamos de Osha-Ifá. É através de Orunmila — o Profeta de Deus, a Testemunha de Deus da Criação — que esse conjunto filosófico se expressa. Ifá relata que na criação do mundo por Olodumare, este determinou que Orunmila testemunhasse tal ato, concedendo-lhe a custódia dos mistérios da vida humana. Orunmila foi encarregado de promover a redenção da humanidade por meio de Ifá, desempenhando o papel vital de disseminador dos desígnios divinos na Terra. Isso permitiria aos seres humanos entenderem seu propósito de vida e, por consequência, buscar a própria evolução conforme o destino pré-estabelecido. Esta jornada evolutiva os levaria às respostas necessárias para superar adversidades, culminando na realização pessoal e no sucesso da missão de cada um. Aqueles que não seguissem tal caminho de crescimento enfrentariam as adversidades do mundo, criadas por Olodumare para conferir significado à vida e seus objetivos criativos, falhando assim em seu percurso e sendo obrigados a reencarnar sob condições mais adversas, devido à não superação dos desafios impostos pelo destino. Orunmila, uma divindade de suprema sabedoria dentro da cultura iorubá e considerado o maior dos Orixás devido à sua profundidade de conhecimento e relevância para a humanidade, foi a quarta entidade criada por Olodumare, com a tarefa específica de assegurar a salvação humana no planeta. Sua sabedoria é tamanha que Orunmila é o único que pode interpretar as palavras de Olodumare (Ifá). Enquanto Orunmila atua como mediador entre Olodumare e sua criação, Ifá representa o sistema religioso em si. É crucial reconhecer que Orunmila desempenha o papel de elo, sendo o único a compreender o início e o fim de tudo no universo.
Maferefun Orunmila!
Maferefun Ifá!
Babalawo Rogério Amorim
Awo ni Orunmila Iwori Boshe Ifá L’omã. Consagrado em Ifá pelas mãos do Maestro Oluwo Siwaju Evandro Luis de Carvalho Otura Airá Ifá ni L’Órun. É membro da Associação Yorubá Cuba-Brasil... [+ informações do Babalawo Rogério Amorim]
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