Ilê Omolu Oxum se transforma em terreiro cultural, com biblioteca, galeria de arte, museu e ateliê de moda
- WR Express

- 30 de set.
- 7 min de leitura
Ilê amplia sua atuação e se expande como patrimônio de memória e resistência

✅ 30/09/2025 | 08:14
O Ilê Omolu Oxum, em São João do Meriti, inaugura a Biblioteca Comunitária Ekedi Neide de Oxaguiã, com um acervo diversificado, que une tradição oral e documentação histórica, a partir de publicações e documentos do próprio terreiro e da valiosa coleção pessoal de Mãe Meninazinha de Oxum, 88 anos, um tesouro
documental que abrange desde textos sagrados até registros históricos da
comunidade.
A Biblioteca é composta ainda por publicações doadas por importantes instituições
culturais brasileiras: a Pinakotheke, o Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos (IPN), o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o Museu do Folclore e o Museu Nacional de Belas Artes, representando um importante passo na democratização do acesso ao conhecimento sobre as tradições religiosas de matriz africana e a cultura afro-brasileira, além de criar pontes entre a tradição oral e o conhecimento acadêmico.
Mãe Nilce de Iansã, coordenadora do projeto, destaca que "a Biblioteca Comunitária Ekedi Neide de Oxaguiã é “um marco histórico na preservação e difusão da cultura afro-brasileira e dos saberes tradicionais do Candomblé, e não é apenas um repositório de livros, mas um centro vivo de conhecimento ancestral".
"Aqui, a comunidade terá acesso não apenas a textos escritos, mas à sabedoria que
se transmite através de gerações, por meio de rodas de leitura, oficinas e outras
atividades educativas que estamos programando".
O nome da biblioteca homenageia Ekedi Neide de Oxaguiã, bisneta de Iyá Davina de Omolu e figura respeitada na tradição do Candomblé, reconhecendo o papel fundamental das mulheres na preservação e transmissão dos saberes religiosos afro-
brasileiros. A escolha do nome simboliza a continuidade entre passado e presente,
honrando aquelas que dedicaram suas vidas à manutenção das tradições.
A iniciativa representa um marco na luta pela valorização da cultura afro-brasileira e
pelo reconhecimento dos terreiros como espaços legítimos de produção e preservação
de conhecimento. O projeto dialoga com políticas públicas de promoção da igualdade
racial e de valorização da diversidade cultural brasileira.
O Ilê Omolu Oxum, fundado em 6 de julho de 1968 por Mãe Meninazinha de Oxum,
uma das mais respeitadas ialorixás do país, se consolidou como um espaço inclusivo,
de resistência, com forte atuação no campo dos Direitos Humanos, Assistência Social
e Cultura, e projetos direcionados à população em situação de vulnerabilidade social,
sobretudo mulheres que são vítimas de racismo, sexismo e misoginia.
MUSEU MEMORIAL IYÁ DAVINA e GALERIA DE ARTE MÃE MENINAZINHA DE
OXUM
Além da Biblioteca Comunitária Ekedi Neide de Oxaguiã, o Ilê Omolu Oxum abriga
a recém-inaugurada Galeria de Arte Mãe Meninazinha de Oxum, que apresenta a
exposição “Odara – Entre cores e memórias”, com quinze pinturas em acrílica sobre
tela, inéditas ao público, criadas por Meninazinha de Oxum entre 2004 e 2011. A curadoria é de Marco Antonio Teobaldo de Oxóssi, que, entre 2011 e 2023, foi curador do Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos (IPN), e é também curador do Museu Memorial Iyá Davina, no Ilê Omolu Oxum.
Teobaldo observa que “este recorte temporal da produção artística da ialorixá representa um período de intensa maturidade espiritual e criativa, quando ela canalizou para as telas suas memórias e sua profunda conexão com o sagrado”. Ele
explica que "Odara" é uma palavra iorubá que significa "bom", "belo", "excelente" e
“evoca a concepção estética fundamental das culturas africanas, onde beleza e
bondade são indissociáveis”. “Nas telas de Mãe Meninazinha de Oxum, o odara se
manifesta como expressão visual da harmonia cósmica, do axé que permeia todas as
coisas e das tradições transmitidas através das gerações”, diz.
O curador salienta que as memórias do subtítulo da exposição não se referem “apenas
às memórias pessoais da artista, mas também às memórias coletivas, ancestrais, que
atravessam séculos e oceanos para se materializar nas telas contemporâneas”.“São
memórias que resistiram à travessia atlântica, à escravidão, à perseguição religiosa,
ao racismo e que agora encontram novo vigor expressivo através da arte pictórica de
uma das mais respeitadas ialorixás do Brasil”, afirma.
A Galeria de Arte e a Biblioteca integram o ambicioso Plano Político e Pedagógico Museu Memorial Iyá Davina, projeto contemplado pelo edital Somos Museus, da
Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro (SECEC-RJ),
que abarca as atividades de inventário participativo, conservação de patrimônio
cultural, criação de galeria de arte e estruturação da reserva técnica. Esta iniciativa
representa o reconhecimento oficial da importância dos terreiros como espaços
de preservação cultural e educação comunitária. O apoio da SECEC-RJ através do
edital Somos Museus demonstra o compromisso do Estado com a democratização
cultural e o reconhecimento da importância dos espaços comunitários na construção
de uma sociedade mais justa e inclusiva.O edital Somos Museusé um programa da
Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro, que visa a
fortalecer e democratizar o acesso aos museus e espaços culturais fluminenses.
Mãe Nilce de Iansã, coordenadora do projeto, diz que a exposição “Odara – Entre
cores e memórias”surge “como o primeiro de muitos diálogos que esta galeria
proporcionará entre o sagrado e o estético, entre a tradição e a contemporaneidade”.
“Sob a curadoria sensível e experiente de Marco Antonio Teobaldo de Oxóssi, a
exposição estabelece pontes entre o individual e o coletivo, entre o íntimo e o
universal, revelando como a arte pode ser veículo de preservação da memória e de
afirmação identitária”.
Para acessar o catálogo da exposição clique no link Odara - Catálogo -
ago2025.pdf[1].pdf
O Museu Memorial Iyá Davina, criado em 1998 por iniciativa de Mãe Meninazinha
de Oxum,possui um acervo com mais de 150 itens inventariados, entreobjetos
sagrados e de uso rotineiro, fotografias e documentos guardados pela matriarca, relacionados à casa de axé e sua linha ancestral. Museu Memorial Iyá Davina se configura também como uma importante coleção etnográfica para pesquisa e preservação da memória dos povos de matriz africana. É reconhecido como o
primeiro museu memorial do gênero no Estado do Rio de Janeiro, e recebea atenção
das comunidades tradicionais afro-brasileiras das mais variadas partes do país, além
de estudantes, pesquisadores e turistas. A instituição museológica é registrada pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) e se apresenta como uma das únicas opções
de museus no município de São João de Meriti. Para acessar o catálogo: Museu
Memorial IyáDavina - Ilê Omolu Oxum.
Iyá Davina de Omolu (1880, Salvador–1964, Nova Iguaçu) foi iniciada por Procópio
Xavier de Souza – conhecido como Procópio d'Ogum – no Ilê Ogunjá, em Salvador, em 24 de julho de 1910. No mesmo ano, se mudou para o Rio de Janeiro, com seu marido Theóphilo Pereira, ogã do Ilê Ogunjá, morando inicialmente no bairro da Saúde – uma residência que serviria de hospedagem provisória aos conterrâneos que migravam para a cidade, e que ficou conhecida como "Consulado Baiano". No Rio de Janeiro, ela se ligou ao terreiro do pai-de-santo João Alabá, já famoso e frequentado por figuras importantes da cultura carioca como Tia Ciata. Com a morte de seu líder, em 1924, sua sucessora, Dona Pequena d'Oxaguian e seu esposo Vicente Bankolê, levaram o terreiro para o bairro de Bento Ribeiro, com ajuda de Iyá Davina, ficando lá até 1931. Depois, se mudam para Nova Iguaçu, onde instalam a primeira roça de candomblé da Baixada Fluminense, a Casa-Grande de
Mesquita (então bairro de Nova Iguaçu), com o nome oficial de Sociedade Beneficente
da Santa Cruz de Nosso Senhor do Bonfim. Com a morte de Dona Pequena, Iyá Davina assume o comando do terreiro,sendo sua última ialorixá. Iyá Davina participou da fundação de inúmeros terreiros no Rio de Janeiro, como: Terreiro Bate Folha de João Lessengue; Ilê Axé Opô Afonjá de Mãe Agripina; Terreiro de São Gerônimo e Santa Bárbara, de Mãe Senhorazinha; Ilê Nidê, de Seu Ninô d'Ogun. Foi, também, madrinha de Oruncó de Pai Zézinho da Boa Viagem. Ao falecer em 1964, sua neta biológica e filha de santo, Meninazinha de Oxum, herdou seus fundamentos e fundou a Sociedade Civil e Religiosa Ilê Omolu Oxum, em 1968, na Marambaia, distrito de Tinguá, Nova Iguaçu.
ATELIÊ OBIRIN ODARA
No Ilê Omolu Oxum também está o Ateliê Obirin Odara, criado em 2013 com o
objetivo de preservar as tradições e técnicas de costura ensinadas pela matriarca Iyá
Davina de Omolu desde sua chegada ao Rio de Janeiro, vinda de Salvador com a
sua família, em 1920. Mãe Nilce de Iansã destaca que “o legado de conhecimento
que ela construiu tornou-se alicerce para futuras gerações de artesãos e religiosos”.
“Esse precioso conhecimento tem sido preservado e continuamente transmitido por
Mãe Meninazinha de Oxum, que dedica sua vida ao trabalho incansável de manter
viva a tradição ancestral. Sua atuação representa mais de cinco décadas de resistência cultural, formação espiritual e preservação dos conhecimentos passados
de uma geração para a outra, sobre as indumentárias sagradas”.
No ateliê podem se encontrar, além das vestimentas rituais, roupas femininas e
masculinas, ligadas à cultura afro-brasileira, e ainda acessórios, como colares,
brincos, e bolsas. O projeto abriga também mulheres costureiras e bordadeiras vítimas de violência, sendo portanto um espaço de acolhimento.
Por ocasião do I Seminário Brasileiro de Museologia de Terreiro, no IPHAN_RJ,
em 9 de setembro, foi lançado o catálogo Moda de Terreiro, resultado de pesquisa
feita por Mãe Nilce de Iansã em três instituições no país: o Ilê Omolu Oxum,a Tenda
Espírita de Umbanda Santa Bárbara, em Teresina; e a Comunidade Terreiro Ilê Axé
Iyemonja Omi Olodo e Céu Cacique Tupinambá, em Porto Alegre.
“Este catálogo é fruto de uma jornada pelos terreiros do Brasil, onde pudemos
testemunhar a riqueza infinita dos saberes que nossos mais velhos preservaram por
meio dos fios, das cores, das formas e dos símbolos que compõem nossas indumentárias sagradas. A dimensão comunitária da produção de indumentárias constitui um aspecto fundamental da organização social dos terreiros, fortalecendo solidariedade e vínculos transmissão conhecimentos”, afirma Mãe Nilce de Iansã. Para acessar o catálogo, clique em: MODA DE TERREIRO 2025.pdf
Serviço: Inauguração da Biblioteca Comunitária Ekedi Neide de Oxaguiã
27 de setembro de 2025, às 10 horas
Ilê Omolu Oxum – Museu Memorial Iyá Davina
Rua General Olímpio da Fonseca, 380, São Mateus, São João de Meriti (RJ)
Projeto: Plano Político e Pedagógico Museu Memorial IyáDavina
Financiamento: Edital Somos Museus – SECEC RJ








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